CARTA ABERTA AO REITOR E AO SUPERINTENDENTE DE SAÚDE DA USP

Prezados Senhores

A propósito da perda de dois de nossos companheiros de trabalho, que faleceram em decorrência de infarto fulminante, em menos de uma semana, bem como, da política de saúde do trabalho praticada na USP desde gestões anteriores e aprofundadas na atual gestão…

Nós, funcionários da Prefeitura do Campus da USP da Capital, reunidos no dia 27 de julho de 2022, no nosso próprio local de trabalho, decidimos trazer ao vosso conhecimento e ao do público as seguintes observações e exigências:

Nossa saúde e nossas vidas valem mais do que os interesses políticos e econômicos daqueles e daquelas que têm se revezado nos postos de administração da universidade.

Por isso não podemos aceitar, e não aceitaremos, seguir assistindo passivamente a morte de companheiros de décadas de trabalho enquanto esperamos pela nossa.

E por essa razão repudiamos e exigimos a revisão imediata dessa vossa política de saúde do trabalho, que nos suprimiu o direito aos exames periódicos completos, sem os quais não podemos saber das nossas reais condições de saúde, e nem adotar as medidas preventivas que podem proteger nossas vidas.  E, aqui chamamos nossos companheiros e companheiras das demais unidades e órgãos da Universidade a fazer o mesmo.

Depois de cinco anos sem passar pelos exames periódicos necessários para aferir nossas condições de saúde, e também o eventual nexo causal entre nosso estado de saúde e nossas condições de trabalho, é inadmissível ter que ouvir dos médicos do trabalho quenão é mais permitido a solicitação dos exames complementares”, que são necessários para um diagnóstico sério e eficaz proteção de nossa saúde e nossas vidas. Vale lembrar que por anos, ou decadas, nos fizemos esses exames no HU, mas isso antes dos senhores promoverem o desmonte do Hospital, e logo em seguida anunciarem a tese falaciosa de que nosso atendimento no HU seria uma espécie de “privilégio” a ser banido e cuja defesa seria indício de corporativismo.

O passo seguinte ao desmonte do Hospital foi a supressão de um direito que já era nosso desde antes do HU e do próprio SUS existirem. Referimo-nos aqui ao serviço de atendimento ambulatorial da antiga COSEAS, que prestava atendimento a nós e aos nossos dependentes, e que foi desmontado no início dos anos 90, tendo sua equipe e equipamentos dissolvidos no HU, que por fim acabou desmontado junto com o hospital.

De toda forma, é revoltante demais saber que essa política de desmonte do HU e dos equipamentos de saúde da USP, pensada e levada ao fim e ao cabo de forma absolutamente criteriosa pelos senhores, é parte de uma estratégia para maior lucratividade e enriquecimento dos abutres de branco que atuam no ramo da medicina privada, e que junto com seus sócios, Professores Doutores, proprietários privados das fundações (de direito privado) das faculdades de medicina das universidades públicas desse país, comercializam ou vendem atendimento e assistência à saúde para quem possa pagar, ou seja, em última instância, negociam nossa saúde em detrimento de nossas vidas.

Em suma, é necessário e inevitável constatar que a política de saúde aplicada na USP pelas gestões  de sucessivos reitores,  em detrimento dos direitos e das necessidades dos trabalhadores e trabalhadores da Universidade, assim como da população; é a mesma política de saúde implementada pela direita com Doria e Alckmin, que também vem sendo implementada pelo  abominável governo  de extrema direita de Bolsonaro, em detrimento dos direitos e das necessidades da classe trabalhadora e da população pobre do país.

Um excelente exemplo da barbárie a qual nos referimos foi a aprovação no Conselho Universitario (CO) desta Universidade do repasse de 217 milhões de reais ao HC de São Paulo e o HC de Ribeirão Preto, dois hospitais da Secretaria Estadual da Saúde, e nem sequer um centavo a mais para investir no HU e Centros de Saúde da USP, que sofrem com falta de pessoal e equipamentos, em detrimento da assistência à nossa saúde, de nossos dependentes e da população. Não há vestígio de racionalidade num investimento de 217 milhões de reais “em reformas” e “construção de novas instalações” em dois hospitais pertencentes a uma secretaria de estado, enquanto um dos hospitais da universidade, o HRAC (ÚNICO NO MUNDO) é desvinculado e o outro, o HU, segue submetido à politica do desmonte contínuo, sofrendo com falta de pessoal, equipamentos e demais investimentos necessários, em detrimento das condições de vida e de trabalho dos profissionais de saúde que atuam no Hospital, e da assistencia à nossa saúde e da população. Isso porque, segundo o reitor Zago, seus sócios e seus seguidores: “não seria função da USP gerir e nem gastar dinheiro em equipamentos de saúde. Uma afirmação que encerra um inegável tom de cinismo, pois o HRAC, desvinculado por proposta do Zago, com as bençãos do atual reitor, está sendo entregue para gestão da FAEPA, uma fundação de direito privado de propriedade dos professores titulares da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, (que tem como associados o ex-reitor da USP e o atual), fundação esta que vai receber em mãos um bilhão de reais em cinco anos pra gerir o hospital.

Aqui chegamos ao nó da questão, onde o discurso falacioso usado para fundamentar a desvinculação do HRAC e o desmonte do HU termina desmascarado! Se não, vejamos: depois de ouvir, ler e reler que a USP não podia gastar dinheiro com hospitais e equipamentos de saúde, estamos ouvindo, lendo e relendo a respeito de um investimento (gasto) da USP no valor de 217 milhões, em dois hospitais da Secretaria Estadual da Saúde. Será que de repente voltou a ser obrigação da USP gastar parte de seu orçamento com saúde? Nada disso!

A verdade mesmo é que se trata de um montante de verbas entregue às mãos das OSS, que são as atuais gestoras dos referidos hospitais, ou seja, as fundações das faculdades de medicina de São Paulo e de Ribeirão Preto. Por isso não foi destinado nenhum centavo ao HU, pois uma vez que o HU ainda está vinculado à USP, situação esta que não favorece a gestão do seu orçamento por nenhuma OS ou outra instituição privada, isenta de prestação de contas, o HU não é merecedor de investimentos, nem para contratações, e muito menos para reformas ou construção de novas instalações. Isso, de acordo a lógica derivada dessa estratégia que visa negociar a saúde como qualquer outra mercadoria, tendo como objetivo maior a obtenção de lucros e não a missão de salvar vidas.

Essa estratégia privatista e as políticas dela derivadas, que têm suprimido as condições de trabalho dos funcionários e funcionárias do HU e do CSEB, é o que têm levado ao fechamento de leitos, suspensão e não agendamento de cirurgias eletivas, redução do atendimento aos funcionários da USP e à população, bem como à não realização de nossos exames periódicos complementares, que tem nos negado a oportunidade das medidas preventivas que podem prolongar um pouco mais as nossas vidas, evitando que sejamos surpreendidos pela morte enquanto trabalhamos.

Por fim, declaramos nosso compromisso com a defesa intransigente do SUS. Mas, chamamos a atenção para o fato de que só quem pode salvar vidas são as equipes médicas do SUS, as equipes de enfermagem do SUS, as equipes de laboratórios e de administração de hospitais e equipamentos de saúde do SUS, e que para isso necessitam de instalações, de leitos, e toda uma estrutura equiparada a real demanda, ao passo que em contrapartida, a aplicação a frio da letra morta das regras do SUS sobre equipes e estruturas subdimencionadas, ao contrário dos propósitos do SUS, pode levar pessoas à morte por desassistência.

Diante das considerações, reafirmamos que não aceitaremos a realização de consultas onde nem sequer nossa pressão arterial tem sido aferida, em substituição aos exames periódicos!  E exigimos o direito de refazer nossos exames periódicos no HU, incluindo todos os exames complementares necessários para proteção de nossa saúde e de nossas vidas.

Teminamos essa carta com um chamado aos nossos companheiros e companheiras de todas as unidades, da capital e do interior para cerrar fileiras junto ao nosso Sindicato numa luta sem tréguas ou concessões em defesa do HU!

 Por todas as contratações que se façam necessárias para a reabertura de todos os leitos, garantindo plenas e dignas condições de trabalho para os funcionários do Hospital!

O mesmo para o CSEB!

Pela revogação da desvinculação do HRAC! Que reitor pare de colocar os seus interesses e de seus sócios na FAEPA acima do estatuto da Universidade, e que suspenda todas as tratativas para consumação da entrega do HRAC para a Secretaria Estadual da Saúde até que essa questão seja pautada e rediscutida no Conselho Universitário, conforme pedido assinado por 32 (trinta e dois conselheiros): o que tem sido ignorado até então.

TRABALHADORES E TRABALHADORAS DA PREFEITURA DO CAMPUS DA CAPITAL, REUNIDOS NO DIA 27 DE JULHO DE 2022.